Defensor Potiguar
“Não se pode perder de perspectiva que a frustração do acesso ao aparelho judiciário do Estado, motivada pela injusta omissão do Poder Público — que, sem razão, deixa de adimplir o dever de conferir expressão concreta à norma constitucional que assegura, aos necessitados, o direito à orientação jurídica e à assistência judiciária —, culmina por gerar situação socialmente intolerável e juridicamente inaceitável” Ministro Celso de Mello
sexta-feira, 9 de outubro de 2015
Audiência de Apresentação: do rabisco ao desenho.
sábado, 22 de fevereiro de 2014
O ladismo como partido
A cada dia que passa, a sociedade brasileira está mais polarizada. Não existe meio termo. No Facebook, no Twitter, nas salas de aula, na mesa de bar ou de jantar, temos tido cada vez menos paciência com a opinião do outro.
Tenho amigos de "esquerda" e de "direita" (se é que isso ainda existe). Estabelecido quem está de que lado, havendo um encontro de amigos de ambos os lados, é fácil adivinhar como a conversa vai se desenrolar.
Basta ver as notícias na imprensa de direita ou conservadora sobre as manifestações da Venezuela. Lá, as manifestações são a resposta de um povo oprimido por uma ditadura velada. Toda violência é culpa do Governo antidemocrático e a Polícia é a expressão da repressão. Não importa se esta simplificação é ridícula, nem se a cobertura escancara uma patética contradição com o noticiário sobre as manifestações aqui no Brasil. Aqui, inicialmente, as manifestações eram a revolta de um bando de desocupados, por uma ninharia (vinte centavos), e que demonstravam a desconsideração "desse povo da esquerda" com o direito de ir e vir do "cidadão de bem" que precisa ir trabalhar e produzir. Depois da divulgação de diversas imagens de violência policial gratuita, inclusive contra jornalistas, a grande imprensa passou a ver as manifestações como uma manifestação legítima da liberdade de expressão, contando com a participação de uma maioria pacífica, mas que era prejudicada por uma minoria de "baderneiros". Mas o noticiário focava 90% das imagens e notícias na ação dos ditos baderneiros. Após o surgimento dos black blocs e da morte do cinegrafista Salvador, a direita só fala em terrorismo.
Do outro lado, a imprensa de esquerda tem a certeza que a Venezuela tem um Governo justo e democrático, mas sua atuação em prol dos pobre irritou as elites e elas planejam um golpe. Os EUA, interessados no petróleo venezuelano, está por trás de tudo, financiando as manifestações golpistas. A Polícia apenas resiste à violência dos golpistas. Trata-se também de uma simplificação, pois basta ver como foram apertadas as últimas eleições venezuelanas para perceber que se trata de uma sociedade dividida. Existe insatisfação de parte da população com algumas medidas do Governo, consideradas realmente no sentido contrário do desenvolvimento democrático. Por aqui, as manifestações são orquestradas por golpistas, estimuladas pela imprensa e financiadas por inimigos do Governo e (haja dinheiro) pelos EUA. Mais uma vez, trata-se de uma simplificação. As manifestações começaram por conta do aumento das passagens de ônibus em algumas capitais. Normalmente, elas foram organizadas por partidos de ultraesquerda e por sindicados e entidades estudantis. Depois da divulgação da violência policial despropositada, principalmente pelas redes sociais, as manifestações foram vitaminadas, com pico no meio do ano passado, pois várias pessoas saíram às ruas em solidariedade aos agredidos injustamente. Naquele momento, as manifestações eram mais pela liberdade de expressão e manifestação que por uma pauta específica. A maioria protestava contra a péssima qualidade dos serviços públicos. Para enfrentar a violência policial sem serem identificados, surgiram os primeiros mascarados. Depois, parte desses mascarados aderiu à estratégia black bloc que busca chamar a atenção da imprensa provocando danos ao patrimônio privado, principalmente grandes redes de fast foods e bancos. Durante todo este tempo houve excessos da polícia e de manifestantes, mas a análise das manifestações passou a se reduzir a isso.
Estou cada vez com mais preguiça com tanta contradição e tanto ladismo.
segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014
Publicada a Comissão do Concurso de Defensor Público do RN
O CONSELHO SUPERIOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, no uso das suas
atribuições legais que lhe confere o artigo 12, incisos XI, da Lei Complementar Estadual de n. 251/2003, e
tendo em vista o disposto na Resolução nº 045 de 08 de março de 2013, publicada no Diário Oficial do
Estado, edição nº 12.906, em 09 de março de 2013,
D E L I B E R A:
Art. 1º. F I C A constituída, conforme deliberação do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado do
Rio Grande do Norte, a Comissão do II Concurso para Ingresso na Carreira de Defensor Público do Estado do
Rio Grande do Norte – classe inicial, na forma seguinte:
Presidente da Comissão: JEANNE KARENINA SANTIAGO BEZERRA – Defensora Pública-Geral do Estado,
matrícula de nº 197.763-6.
Membro Titular: CLÁUDIA CARVALHO QUEIROZ – Defensora Pública do Estado, matrícula nº 197.830-6 (Eleita
pela Categoria).
Membro Suplente: Hissa Cristhiany Gurgel da Nóbrega Pereira – Defensora Pública do Estado, matrícula nº
203.627-4. (Indicação do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte, nos
termos do §1º do art. 5º da Resolução nº 045/2013-CSDP).
Membro Titular: IGOR MELO ARAÚJO - Defensor Público do Estado, matrícula de nº 203.653-3 (Indicação do
Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte).
Membro Suplente: NÚNCIA RODRIGUES DE SOUSA CONRADO PONTES – Defensora Pública do Estado,
matrícula nº 39.957-4. (Indicação do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do
Norte, nos termos do §1º do art. 5º da Resolução nº 045/2013-CSDP).
Membro Titular: RENATA ALVES MAIA - Defensora Pública do Estado, matrícula de nº 197.764-4 (Indicação
do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte).
Membro Suplente: VANESSA GOMES ÁLVARES PEREIRA – Defensora Pública do Estado, matrícula nº 197.772-
5. (Indicação do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte, nos termos do
§1º do art. 5º da Resolução nº 045/2013-CSDP).
Membro Titular: MARCONI ANTAS FALCONE DE MELO - Promotor de Justiça. (Representante do Ministério
Público do Estado do Rio Grande do Norte).
Membro Suplente: LUIZ MÁRIO FÉLIX DE MORAIS GUERRA - Promotor de Justiça. (Representante do
Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte).
Membro Titular: EVANDRO MINCHONI – OAB/RN nº 4196 - Advogado (Representante da Ordem dos
Advogados do Brasil – Seccional do Estado do Rio Grande do Norte).
Membro Suplente: FRANCISCO IVO CAVALCANTI NETTO – OAB/RN nº 1812 - Advogado (Representante da
Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Estado do Rio Grande do Norte).
Art. 2º. Esta Deliberação entra em vigor na data de sua publicação no órgão oficial.
Natal (RN), 14 de fevereiro de 2014.
JEANNE KARENINA SANTIAGO BEZERRA
Presidente do Conselho
NELSON MURILO DE SOUZA LEMOS NETO
Membro nato
CLÍSTENES MIKAEL DE LIMA GADELHA
Membro nato
JOANA D’ARC DE ALMEIDA CARVALHO BEZERRA
Membro eleito
ANNA KARINA FREITAS DE OLIVEIRA
Membro eleito
FABRÍCIA CONCEIÇÃO GOMES GAUDÊNCIO
Membro eleito
RODRIGO GOMES DA COSTA LIRA
Membro eleito
FELIPE DE ALBUQUERQUE RODRIGUES PEREIRA
Membro Suplente
Suspenso edital do concurso para Defensor da Paraíba.
Haja vista uma série de reclamações quando ao conteúdo do Edital do Concurso para o Cargo Defensor Público do Estado da Paraíba, o edital foi suspenso para adequações.
Assim que for corrigido, divulgaremos o novo edital aqui.
sábado, 15 de fevereiro de 2014
A jornalista e os justiceiros do Flamengo
Por David G. Borges
Este texto se destina a quem tem dificuldade de entender o motivo pelo qual Rachel Sheherazade recebeu tantas críticas a respeito de seu comentário no Jornal do SBT, em 5/2/2014, quando comentou e justificou a ação de justiceiros que espancaram, mutilaram, desnudaram e acorrentaram a um poste um jovem que supostamente assaltava pessoas no bairro do Flamengo, no Rio de Janeiro:
1. – O pensamento dela parte de uma visão distorcida do filósofo Thomas Hobbes (1588-1679). Resumidamente, Hobbes afirmava que o ser humano em “estado de natureza” (sem uma estrutura política que o limite) iria sempre perseguir a satisfação de seus desejos, o que resultaria em incessantes conflitos entre as pessoas quando o desejo de um entrasse em conflito com o do outro. Isso resultaria em uma “guerra de todos contra todos”, e daí deriva a necessidade de um Estado forte – e absolutista – que através de sua enorme força repressiva conseguisse limitar os conflitos e assim preservar a integridade física das pessoas – ao custo de sua liberdade. O erro de Rachel Sheherazade nesse aspecto: Hobbes nunca defendeu que os cidadãos seriam capazes de executar “justiça” por conta própria – pelo contrário, considerava que a população em geral é intelectualmente incapaz para discernir sobre questões de justiça, e que todos (sem exceção) possuem o mesmo potencial para serem violentos e despóticos em relação aos seus pares.
2. Quando ela fala sobre o governo ter desarmado os cidadãos e sobre o grupo de justiceiros estar usando de “legítima defesa”, está usando uma interpretação igualmente distorcida de outro filósofo do período moderno, John Locke (1632-1704). Locke afirmava que todo cidadão deveria possuir meios de defender suas propriedades. Mas para Locke a principal propriedade de um ser humano é seu próprio corpo, e este é inviolável – com esse argumento Locke se opôs fortemente à tortura, à pena de morte, a castigos físicos em prisioneiros e à escravidão como fora praticada nas Américas (ele admitia a possibilidade de trabalhos forçados como reparação para crimes contra indivíduos). Na verdade, para Locke o direito à propriedade material nada mais é do que uma “extensão” dos direitos de se autopossuir (ou seja, propriedade sobre o próprio corpo), então os bens materiais são secundários em relação à integridade física, que seria inviolável. O pensamento de Locke é a base sobre a qual começou a ser construída a noção de direitos humanos, que pessoas como Rachel Sheherazade – e aqueles que a aplaudem – rejeitam (mesmo sem saberem do que se trata).
“Legítima defesa coletiva”
3. Quando ela defende que alguém seja capaz de determinar quem é culpado ou inocente, julgar qual seria a pena aplicável e executá-la, está violando um dos fundamentos mais básicos de toda a organização política ocidental: a divisão de poderes. Essa noção se iniciou com Locke (já citado), mas foi aprimorada pelo pensador Montesquieu (1689-1755). Para Locke, quanto mais “fraco” for o Estado, menor a possibilidade dele se tornar tirânico e abusar do cidadão (o que é uma crítica ao que Hobbes, também já citado, defendia). Montesquieu formulou que o estado deveria, portanto, ser dividido em três seções distintas, cada uma com função diferente: aquela que faz leis, aquela que julga as relações entre cidadãos de acordo com as leis já existentes, e aquela que executa as leis e os julgamentos. Aquilo que hoje chamamos de Legislativo, Judiciário e Executivo, respectivamente. Ao defender a atitude dos justiceiros (ou de policiais que realizam execuções sumárias – coisa que ela também já defendeu), ela está eliminando essa divisão de poderes: o mesmo que determina regras, julga; o mesmo que julga, executa. A consequência, clara, é a de que alguém que faça essas três coisas ao mesmo tempo passa a ter poder de vida ou morte sobre outro cidadão, sem necessariamente ter preparo ou legitimidade para isso – ou seja, nada mais é do que um déspota. E não faltam exemplos históricos disso: todas as ditaduras da história se basearam na falta de limites entre essas três funções.
4. Quando ela afirma que o fato do rapaz ter fugido imediatamente ao invés de ter prestado queixa é um indício de que ele era culpado de algo, está simplesmente sendo burra: após ser espancado, ter sua orelha arrancada e ser acorrentado nu a um poste – pelo pescoço – alguém em sã consciência iria permanecer no local? Ainda mais sabendo que os mesmos a quem ele deveria reclamar poderiam fazer a mesma coisa novamente, ou podem ter sido coniventes com o que já havia ocorrido? E o fato de que os agressores provavelmente estavam nas redondezas? Qualquer um fugiria correndo em pânico assim que a corrente fosse serrada.
5. A frase “o contra-ataque aos bandidos é o que chamo de legítima defesa coletiva de uma sociedade sem Estado contra um estado de violência sem limite” é absurdamente parecida com as frases usadas por alguns dos movimentos mais violentos da história. Cito como exemplos a Ku Klux Klan (que existe até hoje) e os nazistas à época da Segunda Guerra Mundial – podem procurar vídeos a respeito no YouTube. Todos os movimentos de “limpeza social” se justificam afirmando que estão apenas se defendendo contra uma ameaça externa. Inúmeros grupos terroristas islâmicos emitem exatamente o mesmo tipo de discurso, e se justificam da mesma forma. A ditadura no Brasil também foi instaurada para supostamente livrar o país da “ameaça” do “comunismo” – e, até onde sabemos, deixou 20 anos de repressão, 457 mortos (confirmados) e pelo menos mil outros “desaparecidos” políticos, além de um grande número de exilados.
“Comportamento de massa”
6. Em seu discurso ela propôs que fossem jogados fora todos os fundamentos da Constituição brasileira, além de nossos códigos penal, processual e civil.
7. Ela não atentou para o fato de que os “justiceiros” também cometeram vários crimes graves, e que por isso são potencialmente tão perigosos para a sociedade quanto o homem que “puniram”.
8. Quando falou sobre defensores dos direitos humanos, demonstrou não conhecer sequer o conceito de “direitos humanos”. Ela e seus admiradores acreditam que “direitos humanos” é o nome de alguma coisa genérica que só aparece em casos que envolvem criminalidade, e sempre para defender a parte “errada” da história. Desconhece, por exemplo, que é por causa do conceito de direitos humanos que as pessoas não podem mais ser escravizadas, que é proibido chicotear alguém para que trabalhe mais, que jornadas de trabalho são limitadas a um determinado número de horas, que ninguém pode ser preso sem justificativa, que todos devem ter direito a um julgamento justo e a ampla defesa, que tortura não é aprovada como método de interrogatório, que o governante não pode ordenar a execução sumária de alguém que não goste, que o estado deve providenciar o mínimo necessário para a sobrevivência e a educação das crianças, que jovens menores de idade não podem ser vendidas para casar, que o governante não pode exigir de um casal recém-casado que a mulher passe a noite de núpcias com ele... coisas que afetam o cidadão comum, que poderia ainda estar sendo vítima disso tudo – como já aconteceu em outros momentos históricos.
Ou seja, a mentalidade de Rachel Sheherazade precisa alcançar,no mínimo, o século 17. E eu nem entrei em outros pormenores, como os fundamentos da ética kantiana (que também é base da concepção de direitos humanos), da ética cristã (ela alega ser cristã), dos crimes que ela cometeu ao falar aquelas barbaridades em rede nacional (incitação ao ódio e apologia ao crime), do fato de que a criminalidade é fruto de condições sociais e por isso o indivíduo que se torna criminoso não tem total controle sobre sua escolha (coisa que se sabe desde o século 19), que o sentimento de revanchismo pode levar a população a um “comportamento de massa” que resulte em um movimento totalitário (fenômeno que ocorreu na Segunda Guerra Mundial, mas só foi explicado academicamente na década de 1950), e assim sucessivamente.
No final das contas, quando você concorda com Rachel Sheherazade isso diz muito mais a seu respeito do que a respeito dela.
Defensor Público!
Surge a Defensoria Pública, guardiã impar do progresso humanitário, para aconselhar, postular e defender direitos daqueles que, em termos de América Latina, se costuma designar como los olvidados (...). Como representante dos interesses da classe economicamente oprimida, o Defensor Público tem ainda o dever de amparar moralmente seu assistido, principalmente quando em confrontação com adversário integrante da classe dominante, esclarecendo a razão social e econômica do conflito, e a possibilidade de o mesmo fazer valer seus direitos perante a lei, com a garantia de igualdade formal preconizada pela Constituição Federal (...). O Campo de batalha do Defensor Público não se acha inserido no autoritarismo ou na prepotência. Seu instrumento de luta não se revela pelas armas ou pela violência. Ao contrário, a missão do Defensor Público se norteia pela razão, pela lógica e pelo equilíbrio, de modo a que seus atos traduzam conceitos de sentido universal, onde a verdadeira Justiça seja praticada em toda sua extensão. (PETER ANDREAS FERENCZY. "Considerações sobre aspectos da evolução da Defensoria Pública").
sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014
Publicado HOJE edital para concurso de Defensor Público da PB
A DP-PB vai fazer um concurso relâmpago, com término previsto para Junho/2014.
Para ter acesso ao Diário Oficial de 14/02/2014, onde foi publicado o Edital, clique aqui.
Atualização em 17/02/2014:
O edital foi suspenso para adequações. Quando corrigido será novamente divulgado aqui.
Sobre a vingança privada.
Nos últimos dias, temos visto nas redes sociais diversas manifestações contra e a favor da "opinião" da apresentadora do Jornal do SBT. Já compartilhei diversas análises sobre o que a musa dos reacionários falou. Nada a acrescentar.
O que queria comentar era sobre o fato que gerou o comentário. Vamos aos detalhes colhidos nas diversas matérias sobre o caso.
Um grupo de amigos virtuais marcaram pelo Facebook de se encontrar e, em suas motos, "patrulhar o Aterro do Flamengo em busca de potenciais assaltantes". O objetivo, claro, era castigar "meliantes". Um deles chegou supostamente dizer em uma entrevista que pretendiam mesmo era matar. Existem matérias que apontam que o grupo tinha entre 03 e 30 integrantes (?¹?).
Na rua, avistaram um adolescente de 15 anos, negro e pobre, estava na rua conversando com amigos também negros e pobres.
Não há nenhum relato de que o adolescente havia acabado de cometer um crime nem de que tenha sido reconhecido por alguma vítima naquele dia. Não existe relato de que o adolescente estivesse armado ou com o produto de algum crime.
Mas todas as matérias afirmaram que o adolescente já tinha pelo menos 03 passagens por assalto e furto. Por isso foi descrito como assaltante, bandido, meliante... Este detalhe merece mais algumas reflexões.
Se o menino tinha 15 anos e realmente cometeu atos infracionais, estes registros são (ou deveriam ser) sigilosos. Não é qualquer um que tem acesso à esses dados.
Por outro lado, como não existe a informação de que o menino havia cometido qualquer ato infracional naquele dia e como não é tão fácil assim "dar a sorte" de topar com um flagrante nas ruas, deduzo que os "justiceiros" buscavam encontrar alguém com passagem pela polícia para exercer sua vingança. E eles tinham os meios para reconhecer essas pessoas.
Isto tudo faz-me crer que entre o grupo de "justiceiros" havia pelo menos um com acesso a antecedentes criminais (inclusive sigilosos) e em uma linha de trabalho que o permita reconhecer pessoas com passagem.
Então vejam só. Estamos falado de um menino que foi espancado por um grupo de pessoas em número bem superior (covardemente), levou golpes na cabeça, foi humilhado, furtado (levaram suas roupas e documentos), amputado (parte de sua orelha) e deixado preso a um poste em exposição pública. Os bombeiros tiveram que usar um maçarico para soltá-lo!
O motivo da tortura? Ele ter passagem pela polícia.
Bater palmas pelas redes sociais vociferando o mantra da ignorância (bandido bom é bandido morto) é uma coisa (bem idiota, é verdade). Outra bem diferente é sair às ruas e torturar barbaramente um menino de 15 anos. Qualquer pessoa minimamente racional entende que apenas psicopatas são capazes de fazer este tipo de coisa.
É por isso que o fato de alguém vir em rede nacional apoiar este tipo de coisa é um absurdo. Falar em "legítima defesa coletiva" é ridículo. O que houve foi tortura covarde e vingativa de um adolescente de 15 anos. E se você não consegue ver isso, amigo, sinceramente, você precisa de tratamento. Urgente.
Simplesmente Amilton Bueno de Carvalho
Será que existe esta tal de homofobia?
Vítima: Nós estávamos em uma festa e, de repente, senti alguém mexendo em meu bolso. Percebi que haviam levado minha carteira. O mesmo aconteceu com diversas pessoas. Uma das vítimas percebeu a ação e reagiu. Mas era um grupo grande e ele acabou sendo severamente espancado. Meu namorado luta artes marciais e ajudou o rapaz, evitando uma surra maior.
Ninguém na sala esboçou qualquer reação à revelação sobre a sexualidade do depoente.
Promotora de Justiça: E você sabe quem é Fulano de Tal?
V: É meu ex-namorado. Estava conosco e também teve bens subtraídos.
PJ: E Fulana de Tal?
V: Amiga nossa. Nós fomos à festa através dela e da namorada dela.
Com um sorriso constrangido, a vítima que até aqui falava com naturalidade acrescentou: era praticamente uma parada gay!!
Encerradas todas as perguntas, o depoente foi embora. Admito que fiquei impressionado com a segurança do depoente quanto à sua sexualidade e com a tranquilidade e naturalidade com que todos encararam o depoimento.
Lembrei de uma conversa que tinha tido pela manhã com outro juiz e outra promotora. Eu me queixava de nossa sociedade machista, homofóbica e racista. Eles retrucaram dizendo que não existia homofobia, que os gays estavam querendo passar leis para obter privilégios, que era praticamente uma ditadura gay, etc. Talvez, haja vista o ocorrido na audiência da tarde, eles tivessem razão?
A reflexão não durou 5 segundos após a saída do depoente da sala.
O Juiz disse: Isso não é natural!
Um Advogado falou: E vocês viram que ele fez questão de falar várias vezes no namorado? Ele queria chocar!
PJ: Isso não é de Deus! Deus fez Adão e Eva!
Visando evitar um constrangimento, resolvi alertar: Eu vou ficar calado, pois meu pensamento é diferente! Todos se entreolharam, mas não se intimidaram.
Uma Advogada falou: E eles agora querem até casar!
J: Do jeito que o Supremo está, vão acabar autorizando, embora a CF seja clara, fazendo questão de dizer "o casamento entre um homem e uma mulher".
Eu: Na verdade, o CNJ já determinou que todos os cartórios do Brasil realizem os casamentos homoafetivos. Até a minha conservadora PB já tinha decisões neste sentido!
J: Mas é um absurdo eles quererem obrigar agente a aceitar!
PJ: O mais absurdo que acho é eles quererem adotar! Imaginem só! Duas mulheres adotando um menino. Qual seria a figura masculina para ele?
Eu: Mas, doutora, e não existem mães solteiras? Qual a figura masculina aí?
PJ: Ah, mas aí tem um avô né?
Eu: E gay nasce de ovo? Não tem pai não?
Respirei fundo e levantei para ir embora, mas não resisti e acrescentei: Não vou dizer que já não pensei como vocês, pois fui criado na mesma sociedade racista, machista e homofóbica. Mas já faz um tempo que luto contra estes meus instintos sombrios. Ainda mais depois que me tornei Defensor Público. Não fica bem para alguém que tem entre suas atribuições a luta pela dignidade da pessoa humana ficar por aí destilando preconceitos.
Saí da sala e até imagino o rumo que a conversa tomou.
Qual a distinção entre "bandidos" e "pessoas que cometeram ilícitos"?
Conversando com uma amiga, fiquei curioso quanto ao critério que algumas pessoas usam para distinguir "bandidos" de "pessoas que cometeram ilícitos". Especificamente, a discussão iniciou por conta de uma postagem sobre um cantor sertanejo que teria sido flagrado na posse de munição.
Na minha visão, a distinção passa por uma questão de familiaridade. A familiaridade facilita a alteridade, o se colocar no lugar do outro. Quando o acusado de um crime é alguém com quem você se identifica, em quem você se enxerga ou mesmo admira, você não vai chamá-lo de "bandido". Para você, será apenas uma pessoa que cometeu um erro.
O referido cantor explicou que alguém deve ter colocado a munição em sua mala apor engano. Certamente será absolvido. Provavelmente nem denunciado. O Promotor ou Juiz vai justificar que a versão do cantor é crível inclusive pelo fato de ele ser "primário e de bons antecedentes". Mas e se essa mesma desculpa fosse dada por algum morador de favela também primário? Qual a chance de ele ter esse mesmo benefício da dúvida? Imagino que teria levado um monte de cacete e estaria em Alcaçuz esperando meses para ter sua primeira audiência. A denúncia provavelmente falaria no estapafúrdio princípio do in dubio pro societate (que meu amigo Claudio Alexandre Onofre me ensinou a questionar). Este seria facilmente chamado de "bandido".
Não se trata de "ter dinheiro para contratar bons advogados" como muitos dizem. A Defensoria Pública, no limite de sua capacidade, tem feito um trabalho muitas vezes melhor que o de muitos advogados. A questão é a familiaridade. O pobre não tem a mesma capacidade de despertar a alteridade em muitos juízes e promotores.
Quando você fala "alguém que cometeu um ilícito" você o reconhece primeiro como pessoa humana, demonstrando simpatia, compreensão, familiaridade. E isola o fato típico cometido por ele como uma pequena parte de sua vida. O uso do termo "bandido" é um estereótipo, um rótulo. Quando você diz "bandido", você reduz toda a existência de alguém a um aspecto. Ele não é uma pessoa, não tem pai, não tem mãe, não tem circunstâncias. Ele é como uma erva daninha, um mal a ser estirpado.
Isso justifica construções como o mantra da ignorância, o "bandido bom é bandido morto" que nos reduz também à condição de "bandido", ou seríamos apenas "alguém que cometeu o ilícito" de apologia ao crime?
***
"O movimento lei-ordem emerge da dramatização da violência - vista como espetáculo - gerando o tipo-social bandido, consolidando um Estado policialesco. Com a crença penal-cárcere, explode o que se tem denominado Direito Penal do Terror: todos, absolutamente todos, dentro deste modelo, são, foram ou serão delinquentes (aliás, ainda não conheci pessoa que não tenha cometido delito, estou como Demóstenes, com a lanterna acesa em procura do "puro", do "bom")". Em muitas falas, tenho ironizado: em alguns locais ocorre um cenário surreal: o juiz delinquente dá presença, em audiência, a um promotor delinquente que está ausente na solenidade, com a conivência de um advogado delinquente; e nenhum deles (ou seja nós) é delinquente, delinquente é o réu que furtou alguma coisa em algum supermercado - a hipocrisia em seu grau máximo" É o que disse o fantástico Amilton Bueno de Carvalho em seu livro Direito Penal a Marteladas!
Defensoria Pública no RN deve realizar concurso e funcionar nos finais de semana, determina juiz
Fonte: Blog do BG.
Legislador faz terrorismo com terrorismo
Mas sigamos (os otários) com a convicção de que aumentar penas desestimula o crime, mesmo com provas de que isso não faz sentido e evidências de que, na verdade, o que ocorre é o inverso: a pena mais alta leva o agente ao tudo ou nada, cada vez mais imprevisível, e a maior permanência no cárcere, haja vista as condições de nossos calabouços medievais (com todo o respeito às prisões da Idade Média) torna o preso provisório e o reeducando cada vez mais desconectados com sua própria humanidade (como único meio de sobrevivência), resultando muitas vezes em verdadeiros psicopatas.
Excelente texto de Luiz Flávio Gomes:Legislador faz terrorismo com o terrorismo
Por Luiz Flávio Gomes
Foi acionado o botão verde do deplorável populismo punitivo
O inimigo da vez é o terrorista. A Copa do Mundo está chegando e a pressão popular e midiática aumentando. Faltava o pretexto, que veio com os aloprados “Black Blocs” bem como com a morte do cinegrafista Santiago Andrade, durante os protestos no Rio de Janeiro. Enquadrar o terrorista na antiga Lei de Segurança Nacional constitui um duplo problema: de legalidade (porque ela não descreve os atos terroristas) e de lembrança da ditadura militar. Algo precisa ser feito imediatamente. Foi acionado o botão verde do deplorável populismo punitivo. O legislador brasileiro populista, de olho nas próximas eleições, está se comportando de forma mais terrorista que todos os supostos terroristas. Ele diz que vai fazer a sua parte, aprovando leis novas mais duras. Típico charlatanismo, que espelha um tipo de bandidagem política.
“Quando você pune levemente, você passa para a sociedade a ideia de que o crime compensa. E o crime não pode jamais compensar” (lição moralista sobre a criminalidade, vinda justamente de quem, pela sua experiência parlamentar, entende do assunto: Renan Calheiros). O primeiro vice-presidente do Senado, o petista Jorge Viana, num surto de histeria e abominável oportunismo, completou: “Foi, sim, uma ação terrorista o que nós vimos na manifestação” (do RJ).
Emocionalmente sim, jurídica e tecnicamente isso é uma aberração incomensurável, porque confunde o crime comum com o terrorismo. E é o que o irresponsável e irracional legislador, sob “o fogo das paixões” (como dizia Beccaria), está prometendo fazer: deve aprovar um projeto (Romero Jucá foi relator) que transforma todo crime comum que cause “terror ou pânico generalizado na população” em terrorismo, esquecendo-se que este exige uma finalidade ou motivação específica (religiosa, política, ideológica, filosófica, separatista etc.), como tínhamos definido na nossa Comissão de Reforma do Código Penal.
Na sociedade do espetáculo (Debord, Lipovetsky, Vargas Llosa), a lógica da legislação penal emergencial e populista é sempre a mesma: agir logo em seguida a um fato espetacularizado pela mídia, no calor dos acontecimentos e, se possível, com o cadáver ainda sobre a mesa. Assim ocorreu após o sequestro de Abílio Diniz (veio a lei dos crimes hediondos), o assassinato de Daniela Perez (segunda lei dos crimes hediondos), o escabroso assassinato da Favela Naval (lei da tortura), o escândalo dos anticoncepcionais (lei dos remédios falsos, prevendo dez anos de cadeia para a falsificação de esmalte), os ataques do PCC (lei do RDD), a violência nos estádios (estatuto do torcedor) etc.
Aviso importante ao leitor desconectado: nenhuma dessas leis (150 no total, de 1940 a 2013, sendo 72% punitivas) nunca jamais diminuiu qualquer tipo de crime no Brasil. Pura performação simbólica. Mas boa parcela do povo gosta de mais leis, daí o rendimento eleitoral. O sucesso do charlatão está sempre ligado à existência de quem acredita nele. É hora de o brasileiro medianamente informado dizer que não quer mais cumprir o papel de otário.
terça-feira, 30 de abril de 2013
A violência como gozo escópico. Civilização ou barbárie?
Entro no Facebook. Vejo o amigo Manuel Sabino Pontes criticar, estarrecido, uma postagem oriunda de uma determinada comunidade e que foi compartilhada por um conhecido dele. Na postagem, uma fotografia em cores de um homem dominado, ao chão, pisoteado, algemado e com uma pistola em sua boca. Na mesma foto, os seguintes dizeres:
“Ficou com pena dele? Acha isso um tratamento desumano? Sabe quais foram seus crimes? Leve pra casa e descubra.”
Essa postagem teve muitos compartilhamentos. É a espetacularização do grotesco e o mórbido. Isso vende e rende. Seja a sensação de alívio por não estar ali no lugar da vítima, seja a sanha violenta de se estar ali no lugar do algoz. O primitivo se faz presente. Como caçador ou caça. O sangue. A pulsão de morte grita!
Civilização ou barbárie? Há barbárie na civilização. Ou seria o contrário? Nossos ternos, vestidos, perfumes, joias, requintes, enfim, escondem esse predador perverso que se alastra como praga pelo planeta, submetendo, dizimando e destruindo tudo e todas as demais espécies (inclusive a própria) por onde passa, em nome de uma pretensiosa superioridade, justificando sua violência em um discurso contraditório de bem-querer e de luta pelo bem comum. Sendo mais claro: em nome de deus(es) e do amor. E não nos enganemos. O ser humano de hoje – que também goza com o consumismo, mata com armas, radiação e lixo tóxico. É o exterminador do futuro.
Na imagem, o algoz diz: “sou o portador do falo (da arma), do poder. Sou mais homem que você”. Melhor dizer isso do que, na verdade, reconhecer ser, tão somente, mais animalesco. Não falta quem bata palmas. Mas quem aplaude a barbárie o que é, senão, um igual bárbaro que goza ao ver seu desejo de sangue sendo gozado, nem que seja pelo gozo do outro? Há um voyeurismo mórbido aí.
A foto é dramática, mas esse drama humano é ofuscado pela banalização da violência: “ficou com pena dele? Acha isso um tratamento desumano?”.
Ao mesmo tempo, a violência e a morte viram algo íntimo, que amedronta e alivia, pois é a violência ou a morte do outro. No imaginário, a morte do outro fascina como fascina a manada de zebras que olha, aliviada, para aquela que foi feita presa dos leões. “Não fui eu, por enquanto, foi o outro”. Alívio fugaz e sensação de medo constante. A morte está à espreita. Para alguns mais fragilizados, o pânico. Para outros, o desejo de ser algoz. O desejo de linchar. De fazer (in)justiça pelas próprias mãos. Cerram-se os punhos, inconscientemente. Exterioriza-se. Tinha que sair.
Se não dá para usar as próprias mãos, simbolize-se nas palavras gritadas na voz ou, se não der, no papel ou na tela do Facebook. “Curtir”. Toda pulsão tem, ao mesmo tempo, dizia Freud, pulsão de vida e pulsão de morte. São os olhos, nesse caso, como fonte de libido. Há o prazer em ver. É o gozo escópico. Mas como o gozo é fugaz (pois é a busca da coisa perdida), busca-se o novo. Há sempre uma nova imagem a ser gozada. O novo para o velho olhar mórbido. Há sempre um programa policial na TV ou no rádio à disposição. E na busca do gozo escópico, racionaliza-se: é notícia, é informação! Muitos desses programas são no horário do almoço. São comidos pelos olhos.
A imagem acima mostra, claramente, uma cena de tortura praticada por agentes do Estado. Para quem pratica o ato, uma completa corrupção da função pública. A despeito de fazer cumprir a lei, viola-a. A pretexto de perseguir pretensos criminosos, pratica crime tão grave, em frontal violação à lei, em desrespeito ao sistema judicial e à Constituição (art. 5º: “III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”). Enfim, é uma cena de covardia. Mas para isso servem os mecanismos de defesa - projeção, racionalização, negação, identificação... Freud explica.
Portanto, há quem, mesmo assim, goze em fotos como essa, reforçando esse comportamento criminoso do pretenso agente da Lei. “Sabe quais foram seus crimes?”. Só sei de um: é tortura. “Leve pra casa e descubra”. A foto revela o flagrante de um crime. Mas o ódio cega. Por isso, há quem não o veja... Onde está a barbárie? Está na foto. E o bárbaro? Na foto ou no olhar? Em alguns casos, em ambos... E a civilização?