sábado, 31 de março de 2012

Presos do presídio de Caicó terão alimentos por mais uma semana (Tribuna do Norte - 28/03/2012)

Os presos da Penitenciária Estadual do Seridó estão com alimentação garantida por mais uma semana. Isso, porque, uma empresa foi escolhida em caráter emergencial para fornecer os produtos alimentícios.

O problema foi evidenciado esta semana quando a diretora da unidade, Veruska Saraiva, encaminhou oficio ao juiz corregedor Luiz Cândido de Andrade Villaça, informando que a então empresa fornecedora de alimentos não mais o faria por falta de pagamento por parte do Governo do Estado. Foi ai que o magistrado se reuniu com seu colega o juiz André Melo Gomes, da 1ª Vara Civil. Este julgou em novembro de 2011, uma Ação Civil Pública em que bloqueou R$ 336 mil reais dos cofres do Estado, já porque naquela época também ocorreu à falta de alimentos no presídio.

Na manhã desta terça-feira, ao lado dos promotores, Geraldo Rufino de Araújo Júnior e Carlos Henrique Rodrigues, dos Defensores Públicos, Rodrigo Gomes da Costa Lira, e Francisco de Paula Leite Sobrinho, além do advogado Francisco de Assis Medeiros, presidente da Sub-secção da OAB/Seridó os juízes falaram para a imprensa, expondo a real situação do presídio.

Diante do problema atual, os promotores e defensores públicos, autores da Ação Civil Pública, pediram ao juiz André Melo, que determinasse a liberação de parte do dinheiro para que a direção do presídio fizesse uma pesquisa entre três atacadistas da região Seridó, a fim de identificar entre eles o que ofereceria o menor preso para a compra de alimentos para o período de uma semana.

Para o defensor público, Francisco de Pala Leite, o problema chegou ao limite.

"Diante disso nós temos que retirar aquelas pessoas de lá, porque, ou, fazemos isso, caso não sejam tomadas as medidas para o presídio funcionar a contento, ou estará se decretando a morte delas. A outra medida, caso não haja resolução e os problemas persistam, é nós entrarmos com pedidos de habeas corpus para todos os presos, e coloca-los e regime de prisão domiciliar. A verdade é que não tem condições de deixar os presos encarcerados se o Estado não dispõem de condições para mantê-los numa unidade prisional, e eu digo que isso será o reconhecimento total da falência do sistema prisional do Rio Grande do Norte", afirma.

A determinação do bloqueio dos recursos financeiros do Governo do Estado em 2011, por parte da Justiça, se deu para que fosse feita a aquisição de alimentos. Isso porque o Secretário de Justiça Cidadania, Tiago Cortez, disse ao juiz André Melo, que não tinha dinheiro em caixa. O recurso foi bloqueado, inclusive serviria ainda para a que fosse fornecido o alimento aos presos do regime semiaberto, que teria que ficar no albergue nos finais de semana e feriados, porém como não existem refeições, eles saem para tomar café, almoçar e jantar em casa.

O magistrado, disse que em caso de o Estado não tomar as providências para fazer funcionar a entrega de alimentos no presídio, o judiciário fará de tudo para evitar a fome dos presos, e uma possível rebelião.

Durante a entrevista coletiva, o juiz André Melo, não poupou críticas ao sistema penitenciário brasileiro, dizendo que para se cumprir uma pena que desarticule uma organização criminosa, que evite que o estabelecimento prisional seja uma escola do crime, é preciso que este funcione com um mínimo de condições, o que não ocorre.

"Nós temos ações criminosas pensadas e articuladas de dentro do sistema prisional, no Seridó, no Rio Grande do Norte no Brasil inteiro, e, é preciso ter um sistema que isole o crime organizado, e o nosso sistema não isola, pelo contrário fomenta, e o pior viola a dignidade dos que trabalham nele e dos que estão cumprindo penas mais brandas como furtos, e etc… e isso é inadmissível", relata.

Com relação à Ação movida contra o Estado para que este proceda com uma reforma no presídio, foi agendada uma audiência em Caicó em novembro de 2011, e o então secretário, não compareceu. Ele disse que tinha esquecido o compromisso. Esse fato foi inclusive relatado na decisão que determinou a reforma. O Estado recorreu. Na sentença eram para serem aplicadas multas à governadora, ao secretário e ao Estado. No recurso, a sentença foi reformulada, tendo sido mantida somente a multa ao Estado.

Fonte: Tribuna do Norte.

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sexta-feira, 16 de março de 2012

Íntegra de julgamento - STF declara a inconstitucionalidade do modelo de defensoria dativa em Santa Catarina



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Íntegra de julgamento - Supremo declara a inconstitucionalidade da subordinação das Defensorias a Governadores


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Fábio Hollanda cogita deixar a SEJUC

Daqui a pouco o Rio Grande do Norte vai ter mais ex-SEJECs que o Brasil tem ex-BBBs...

Confira a matéria da Tribuna do Norte:


O secretário de Justiça e Cidadania do Rio Grande do Norte (Sejuc), Fábio Hollanda, está disposto a deixar o  cargo. Insatisfeito com o quadro de auxiliares e com a falta de estrutura estatal no que diz respeito principalmente à política de ressocialização de presos, Hollanda já comunicou à governadora Rosalba Ciarlini (DEM) e ao deputado João Maia - presidente estadual do Partido da República (PR) e tutor da ida dele à Sejuc - que pretende deixar a pasta.

"Não é um ultimato. O cargo, juridicamente, é da governadora. Eu não terei nenhum constrangimento em deixar a Secretaria. Eu terei constrangimento em ficar na Secretaria e não conseguir desenvolver um bom trabalho com o dinheiro do contribuinte do Rio Grande do Norte. Se dependesse de mim, na condição de presidente do PR em Natal, o partido entregaria a Secretaria e manteria uma posição independente do ponto de vista administrativo do Governo Rosalba Ciarlini", falou Hollanda, em entrevista exclusiva à TRIBUNA DO NORTE  na tarde de ontem.

Sobre a fuga da penitenciária de Alcaçuz ocorrida poucos dias após ele assumir a Sejuc, Hollanda foi incisivo: "Os presos fugiram por um enfrentamento, fugiram por falta de cuidado, fugiram por negligência e fugiram porque alguns agentes públicos fizeram de conta que estavam segurando os presos e resolveram abrir a porta pra eles saírem".

Empossado secretário de Justiça e Cidadania há exatos dois meses, Hollanda ainda não recebeu nenhum salário, assim como as diárias das viagens que fez. Além disso, o homem que comanda o sistema prisional do Rio Grande do Norte vem sofrendo ameaças por telefone, sente-se seguido nas ruas e não conta com escolta da Polícia Militar.

Fábio Hollanda disse não temer pela própria vida, mas está receoso pelas dos filhos. "Eu soube através de informações oficiais do Ministério da Justiça que como o Comando Vermelho está aqui é necessário que se tenha cuidado e eu não tenho  escolta. Por quê? Porque essa escolta precisa ser feita pela Polícia Militar, através de homens do Bope e eu os pedi, e eles não foram enviados. Até a minha vida eu aceito colocar em risco, desde que eu veja o sistema evoluindo, mas as dos meus filhos não".

Leia a seguir a entrevista exclusiva:

O senhor esteve em Brasília, com o deputado João Maia, e teria  colocado o cargo à disposição da governadora. Procede essa informação?

Eu não posso colocar à disposição o que não é meu. O cargo é do Partido da República. O que eu disse ao deputado João Maia, presidente do meu partido no Estado - eu sou presidente em Natal - foi o seguinte: 'Sem ter condições de montar uma equipe técnica, desde o secretário-adjunto até a minha secretária, sem o mínimo de autonomia, é impossível manter-se essa parceria entre o PR e o Democratas no Estado do Rio Grande do Norte. E que se dependesse de mim o partido entregaria a Secretaria e manteria uma posição independente do ponto de vista administrativo do governo Rosalba Ciarlini.

O senhor está insatisfeito neste momento à frente da Secretaria porque está faltando um quadro de auxiliares técnicos, seria isso?

Falta a gente gerir o Estado pensando nos próximos dez, vinte anos. A gente não pode gerir o Estado sem ter planejamento, sem ter projetos, especialmente...

E hoje não há?

Eu não encontrei. Eu estou tentando fazer...

E está conseguindo?

Estou conseguindo bem abaixo do padrão de excelência que eu quero dar à Secretaria.

A governadora Rosalba Ciarlini está ciente dessa sua insatisfação?

Eu já coloquei isso pra ela, coloquei para o presidente deputado João Maia, em uma reunião com ela. Ela está ciente. Agora, eu posso estar errado, o presidente do meu partido pode estar errado e o sistema pode estar bem. É uma avaliação que a governadora tem que fazer.

O senhor está dando um ultimato?

Se o Governo achar que eu estou errado, não tem problema. O cargo juridicamente é da governadora. Eu não terei nenhum constrangimento em deixar a secretaria, eu terei constrangimento em ficar na secretaria e não conseguir desenvolver um bom trabalho com o dinheiro do contribuinte.

O senhor já recebeu o salário do Governo do Estado?

Não. Não recebi salário, não recebi diária. Meu motorista sou eu quem paga.

O senhor está há dois meses à frente da Sejuc, que lida diretamente com sistema penitenciário. Nesse período, o senhor recebeu alguma ameaça?

As ameças são telefonemas. No meu telefone particular e no meu telefone da Secretaria. Eu recebo ligações em que as pessoas ficam em silêncio. Eu recebi andando na rua e o carro de trás dando sinal de luz e eu entrar e ir pra casa. Meus filhos essas semana. Ontem eu estava em Brasília e recebi a ligação do meu filho que estava saindo do colégio onde ele faz aula particular à tarde e um carro começou a buzinar atrás do carro que ele estava. Eu soube, através de informações oficiais do Ministério da Justiça que como o Comando Vermelho está aqui é necessário que se tenha cuidado e eu não tenho escolta, porque essa escolta precisa ser feita pela Polícia Militar, através de homens do Bope, e eu os pedi e eles não foram enviados, mas até a minha vida eu aceito botar em risco, desde que eu veja o sistema evoluir. A vida dos meus filhos não. Espero que não haja isso de novo.

Qual o problema que ocorre em Alcaçuz?

Alcaçuz foi feita num local inadequado, em cima das Dunas. Claro, hoje a engenharia ela pode tudo. Eu poderia fazer um muro ao redor do presídio com 8 metros de profundidade e aí ninguém vai cavar túnel. Agora o custo financeiro disso é muito alto. Mas já que está pronto, nós temos que conviver com Alcaçuz. Você tem um amontoado de pessoas e você tem - com muita razão - uma pressão imensa que aumentou depois que eu assumi. Por que que aumentou? Porque nós estamos fazendo revistas periódicas. Nós já apreendemos mais de cem celulares, já apreendemos bebidas, drogas. Nós já tomamos medidas para dar seriedade ao sistema. Nós estamos escolhendo pessoas absolutamente éticas e honestas. Não estou dizendo que a corrupção acabou, mas tô dizendo que pelo que se saiba, a corrupção em Alcaçuz acabou.

Secretário, por que que os coroneis PM Zacarias Mendonça e Severino Reis deixaram o sistema penitenciário?

Primeiro lugar, eles foram convidados num período de crise aguda. Os nomes dos dois me foi apresentado pelo coronel Araújo [comandante da PM]. O coronel Mendonça é um homem a quem eu devo uma dedicação. Se você me perguntar por que ele saiu, eu ainda não consegui entender, até porque ele nunca falou comigo pessoalmente. Ele talvez tenha esquecido que o chefe dele, o comandante do sistema penitenciário, era o secretário de Justiça e não o comandante da Polícia Militar. Quanto ao coronel Reis, é um homem tão correto, tão íntegro, tão competente que ele há 30 dias aproximadamente vem me dizendo: 'secretário, eu estou pagando um custo pessoal muito alto, secretário eu já estou numa idade que eu poderia me dedicar mais à advocacia, eu estou fazendo o exame da OAB. Secretário, minha família não queria que eu assumisse esse cargo'.

Como foi que os 41 presos fugiram de Alcaçuz?

Fugiram por um enfrentamento, fugiram por falta de cuidado, fugiram por negligência e fugiram porque alguns agentes públicos fizeram de conta que estavam segurando os presos e resolveram abrir a porta pra eles saírem.

Quem?

A sindicância está comigo. Eu estou analisando, mas posso dizer o seguinte: os militares que não estavam nas guaritas naquele tempo, não estão hoje. Os militares que não estavam na guarita foram negligentes, ou então quem era pra tê-los colocado lá. E os agentes que eram pra estar no pavilhão e não estavam, estavam do lado de fora, também foram negligentes.

Serão punidos?

Serão punidos, se depender de mim. Agora, eu não vou mentir pra sociedade. Para eu poder punir, eu tenho que ter peça de reposição. Eu não tenho como dizer com segurança que nós não teremos outra fuga. Poderemos ter. Cada dia eu acordo olhando para o tempo, para os jornais, para os blogs, para o meu telefone e dizendo assim: 'Meu Deus do céu, graças a Deus não fugiu ninguém'.

Por que havia uma baladeira à disposição de uma agente penitenciário em São Paulo do Potengi, em uma unidade prisional?

Porque não havia uma outra arma. Porque nós não tínhamos a quantidade de agentes necessária para que tivéssemos uma ação social de ressocialização.

O Estado sabia disso?

O Estado não sabia que era tão grave quanto é.

O senhor falou que falta pessoal qualificado no começo da entrevista. E quantidade? Está faltando contratar agentes penitenciários?

Está. Até 2014, no mínimo, precisamos de mais 500 agentes.

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Ipad também é bem de uso pessoal

Eliana Lima noticiou que o excelente Juiz Federal Marco Bruno Miranda, da 3ª Vara Federal de Natal/RN, deu ganho de causa a um advogado que teve tributado um Ipad que trouxe dos Estados Unidos.

O que aconteceu foi o seguinte: o casal estava viajando e resolveu comprar um Ipad. Ao desembarcar no Brasil, o fiscal da Receita viu o aparelho e, por saber que seu valor é superior à cota de importação, cobrou os impostos, bem como uma multa pela não declaração do bem.

O advogado entrou na Justiça.

A Intrução Normativa RFB 1.059/2010, em seu artigo 32 concede isenção do imposto de importação (II), do imposto sobre produtos industrializados (IPI), da contribuição para os programas de integração social e de formação do patrimônio do servidor público incidente na importação de produtos estrangeiros ou serviços (PIS/Pasep-Importação) e da contribuição social para o financiamento da seguridade social devida pelo importador de bens estrangeiros ou serviços do exterior (Cofins-Importação) incidentes sobre a importação de bagagem de viajantes, observados os termos e condições estabelecidos nesta Seção. O § 1º estabelece que a referida isenção observara o disposto no inciso II do caput do art. 2º da Instrução Normativa.

O referito art. 2º, II, define como bagagem "os bens novos ou usados que um viajante, em compatibilidade com as circunstâncias de sua viagem, puder destinar para seu uso ou consumo pessoal, bem como para presentear, sempre que, pela sua quantidade, natureza ou variedade, não permitirem presumir importação ou exportação com fins comerciais ou industriais".

A sentença entendeu que o Ipad se enquadra na definição de bem de uso pessoal, isentando o advogado dos impostos e multas.

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Cerimônia do Sol - Deixando um pouco o Direito de lado

Fugindo um pouco dos temas jurídicos e anda sob o efeito do Dia da Poesia, lembrei hoje de uma viagem que fiz em 2009, para o Uruguai. Em Punta del Este, fomos assistir ao pôr-do-sol na Casa Publo, do Poeta (entre outras coisas) Carlos Vilaró. Encontrei alguns textos na internet que explicam o que encontrei lá. Reproduzo e credito abaixo. Após, algumas fotos nossas no local.


"Era uma casa muito engraçada, não tinha teto, não tinha nada...". Todo mundo conhece esses versos infantis do Vinícius de Morais. O que quase ninguém conhece é a seqüência original: "Era uma casa muito engraçada, não tinha teto, não tinha nada. Ninguém podia entrar nela não, porque na casa não tinha chão. Ninguém podia dormir na rede, porque na casa não tinha parede. Ninguém podia fazer pipi, porque penico não tinha ali, mas era feita com pororó, era a casa de Vilaró".

Vilaró é Carlos Paez Vilaró, amigo pessoal de Vinícius e idealizador do Casapueblo, a casa em Punta Ballena, no Uruguai, onde o poetinha compôs "A casa" para seus netos.

Quem passa por Punta Ballena, a apenas 15km de Punta Del Este, não consegue deixar de se maravilhar com a enorme construção branca, sem nenhuma linha reta, que se esparrama sobre as pedras à beira-mar. Tudo começou em 1958 com uma casinha simples de lata, chamada "La Pionera", que serviria de atelier ao pintor, escultor, arquiteto, cineasta, escritor e ceramista.

Com o tempo, Vilaró começou a cobrir a casa de lata com cimento e cal, pintando sempre o exterior de branco. A casa/atelier foi crescendo e interagindo com o penhasco rochoso de Punta Ballena. Quem a observa, não pode deixar de lembrar de uma mistura de Salvador Dali com Antonio Gaudí. Todo o encanamento do Casapueblo passa pela construção em relevo nas paredes, como se fossem veias de uma enorme estrutura orgânica. "Escultura para viver" é como o próprio artista chama a sua obra, que, 30 anos depois, ainda não está concluída. 

Vilaró, com mais de 80 anos de idade, continua trabalhando na sua escultura, construindo um quarto aqui, uma sala ali... O Casapueblo hoje conta com mais de 70 quartos, todos batizados com os nomes dos primeiros hóspedes. Pelé, Toquinho, Vinícius, Robert de Niro, Brigitte Bardot, Omar Sharif, Alain Delon...

Mas a melhor coisa do Casapueblo é definitivamente a visão do pôr-do-sol, que é comemorada com uma cerimônia onde os hóspedes, nas varandas, escutam uma gravação do próprio Vilaró onde ele fala sobre sua amizade com o sol, que o encontra sempre, no Tahiti ou na África. Com alguma sorte, pode-se assistir ao pôr-do-sol ao lado do próprio artista, que mantém seu atelier no ponto mais alto de sua construção.

Quem não estiver hospedado no Casapueblo, também pode participar da cerimônia do entardecer e ainda assistir a um vídeo sobre a vida e a arte de Carlos Paez Vilaró, cujo filho estava no avião que caiu no Chile, na cordilheira dos Andes, quando por meses tiveram que comer carne humana.


Vilaró escreveu um livro sobre o acidente, mostrando sua aflição de pai. Seu livro acabou virando filme de sucesso em Hollywood, mas esta não foi a primeira incursão do escultor no mundo do cinema. Em 1969, fez um filme chamado "Pulsation", filmado durante três anos no Pacífico, com música de Astor Piazolla, que é considerado o precursor da linguagem dos videoclipes.

Eis o poema que ressoa no sistema de som:

CEREMONIA DEL SOL

Hola Sol …! Otra vez sin anunciarte llegas a visitarnos. Otra vez en tu larga caminata desde el comienzo de la vida.Hola Sol…! Con tu panza cargada de oro hirviendo para repartirlo generoso por villas y caseríos, capillas campesinas, valles, bosques, ríos o pueblitos olvidados.Hola Sol…! Nadie ignora que perteneces a todos, pero que prefieres dar tu calor a los más necesitados, los que precisan de tu luz para iluminar sus casitas de chapa, los que reciben de tí la energía para afrontar el trabajo, los que piden a Dios que nunca les faltes, para enriquecer sus plantíos, y lograr sus cosechas. Es que vos, Sol, sos el pan dorado de la mesa de los pobres. Desde mis terrazas te veo llegar cada tarde como un aro de fuego rodando a través de los años, puntual, infaltable, animando mi filosofía desde el día que soñé con levantar Casapueblo y puse entre las rocas mi primer ladrillo.Recuerdo que era un día inflamado de tormenta, el mar había sustituido el azul por un color grisáceo empavonado, en el horizonte un velero escorado afinaba el rumbo para saltear la tempestad, el cielo se llenaba de graznidos de cuervos en huida, la sierra se peinaba con la ventolera alborotando a la comadreja y al conejo.Pero de golpe como un anuncio sobrenatural el cielo se perforó y apareciste vos. Eras un sol nítido y redondo, perfecto y delineado, puesto sobre el escenario de mi iniciación con la fuerza sagrada de un vitreaux de iglesia. Desde ese instante sentí que Dios habitaba en ti, que en tu fragua derretía la fe y que por medio de tus rayos la transmitía por todos los sitios donde transitabas. Los mismos brazos de oro que al desperezarte iluminan el cielo, al estirarse a los costados entibian las sierras, o apuntando hacia abajo laminan el mar.Hola Sol…! Cómo me gustaría haber compartido tu largo trayecto regalando luz, porque a tu paso acariciaste la vida de mil pueblos, compartiste sus alegrías y tristezas, conociste la guerra y la paz, impulsaste la oración y el trabajo, acompañaste la libertad e hiciste menos dura la oscuridad de los presidios.A tu paso sol, se adormecen los lagartos, despiertan los girasoles y los gallos cacarean. Se relamen los gatos vagabundos, los perros guitarrean, y el topo se encandila al salir de la cueva. A tu paso sol, hay sudor en la frente del obrero y en los cuerpos de las mujeres cobrizas que alcanzan el cántaro de la favela. Con tus latidos conmueves el mar, das música a la siembra, la usina y el mercado.A tu paso corrieron en estampida búfalos y antílopes, desperezó el león, se asombró la jirafa, se deslizó la serpiente y voló la mariposa. A tu paso cantó la calandria, despegó el aguilucho, despertó el murciélago y emigró el albatros.Hola Sol…! Gracias por volver a animar mi vida de artista. Porque hiciste menos sola mi soledad. Es que me he acostumbrado a tu compañía y si no te tengo, te busco por donde quiera que estés. Por eso te reencontré en la Polinesia, cuando te coronaron rey de los archipiélagos de nácar y los arrecifes dentellados de coral, o también en Africa, cuando dabas impulso a sus revoluciones libertarias y te reflejabas en el espejo de sus escudos tribales para inyectarles coraje. Te estoy mirando y veo que no has cambiado, que sos el mismo sol que reverenciaron los aztecas, el mismo de mi peregrinaje pintando por América, el que envolvió la Amazonia misteriosa y secreta, el que me alumbró los caminos al Machupichu sagrado del Perú, el de los valles patagónicos o los territorios del Sioux o del comanche. El mismo sol que me llevó a Borneo, Sumatra, Bali, las islas musicales o los quemantes arenales del Sahara.A diferencia del relámpago que apenas proyecta en la noche latigazos de luz, desde tu reinado planetario, tus destellos continúan activos, permanentes.Alguna vez la travesura de las nubes oculta tu esplendor, pero cuando ello ocurre, sabemos que estás ahí, jugando a las escondidas.Otras veces, en cambio, te vemos sonreír cuando las golondrinas o las gaviotas te usan de papel para escribir las frases de su vuelo.Gracias Sol, por invadir la intimidad de mi atardecer y zambullirte en mis aguas.Ahora serás la luz de los peces y su secreto universo submarino. También de los fantasmas que habitan en el vientre de los barcos hundidos en trágicos naufragios.Gracias Sol…! Por regalarnos esta ceremonia amarilla. Gracias por dejar mis paredes blancas impregnadas de tu fosforescencia.Entre ventoleras y borrascas, cruzando ciclones y tempestades, lluvias o tornados, pudiste llegar hasta aquí para irte silenciosamente frente a nuestros ojos.Porque tu misión es partir a iluminar otros sitios. Labradores, estibadores, pescadores te esperan en otras regiones donde la noche desaparecerá con tu llegada.Y como respondiendo a un timbre mágico despertarás las ciudades, irás junto a los niños a la escuela, pondrás en vuelo la felicidad de los pájaros, llamarás a misa.A tu llegada, se animará el andamio con sus obreros, cantarán los pregoneros en las ferias, la orilla del río se llenará de lavanderas y entrará la alegría por la banderola de los hospitales.Chau Sol…! Cuando en un instante te vayas del todo, morirá la tarde. La nostalgia se apoderará de mí y la oscuridad entrará en Casapueblo. La oscuridad, con su apetito insaciable penetrando por debajo de mis puertas, a través de las ventanas o por cuanta rendija encuentre para filtrarse en mi atelier, abriéndole cancha a las mariposas nocturnas. Chau Sol…! Te quiero mucho…Cuando era niño quería alcanzarte con mi barrilete. Ahora que soy viejo, sólo me resigno a saludarte mientras la tarde bosteza por tu boca de mimbre. Chau Sol…! Gracias por provocarnos una lágrima, al pensar que iluminaste también la vida de nuestros abuelos, de nuestros padres y la de todos los seres queridos que ya no están junto a nosotros, pero que te siguen disfrutando desde otra altura.Adiós Sol…! Mañana te espero otra vez. Casapueblo es tu casa, por eso todos la llaman la casa del sol. El sol de mi vida de artista. El sol de mi soledad. Es que me siento millonario en soles, que guardo en la alcancía del horizonte.

Fontes: aqui e aqui.

 Patrícia, minha esposa, no estacionamento da Casa Pueblo

 Eu, Vilaró, um papagaio de pirata e Patrícia

 Atrás de mim, uma amostra da enorme estrutura, que é mais obra de arte

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quarta-feira, 14 de março de 2012

ADIs 3892 e 4270 - Santa Catarina e seu modelo alternativo à Defensoria Pública

O ano de 2008 foi muito especial para mim. Tomei posse como Defensor Público no final de agosto e, já em outubro tive a oportunidade de participar do Congresso Nacional dos Defensores Públicos daquele ano e defender uma tese que acabou sendo aprovada em primeiro lugar. Para terminar, falei para os colegas de todo o Brasil no encerramento do evento. Muitos choraram comigo naquele dia.

A minha tese foi a Inconstitucionalidade dos Meios Alternativos à Defensoria Pública, que pode ser lida no Jus Navigandi.

Na data de hoje, o Supremo Tribunal Federal teve a oportunidade de analisar muitos dos argumentos que levantei naquela tese.

A ADI 3892 é de 2007 e foi ingressada pela Associação dos Defensores Públicos Federais (ANADEF). A ADI 4270 é de 2009 e é da Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP). Diversas instituições, entre elas a Associação de Juizas para a Democracia (AJD), foram admitidas como amicus curiae.

Resumindo o problema, Santa Catarina se nega a instalar sua Defensoria Pública e estabeleceu um sistema alternativo. Foi formatada uma tabela de pagamento para defensores dativos e a OAB, em troca de 10%, gerencia o repasse dos montantes do Estado para os advogados cadastrados.

ANADEF e ANADEP entendem que a assistência jurídica gratuita deve ser de qualidade. O Defensor Público é aprovado mediante concurso público e tem a qualidade de seu trabalho acompanhada por uma corregedoria. O Defensor Público tem autonomia funcional, podendo inclusive processar o Estado que o emprega. O Defensor Público é impedido de advogar, devendo se dedicar exclusivamente à defesa dos necessitados. O Defensor Público possui (ou deveria possuir) uma estrutura funcional para lhe dar suporte.

O modelo de Santa Catarina não atende estes requisitos de garantia de qualidade.

Gostaria de fazer uma análise diferente das efetuadas no julgamento e mesmo na minha tese. Parto de uma conversa que tive com um juiz de Santa Catarina. O magistrado me relatou o pequeno valor que o advogado recebe por processo (parece-me que cerca de R$ 700,00) e a péssima qualidade da maioria dos advogados que se submete a receber este valor.

Quando o estudante está no curso de Direito, ocorre uma divisão natural entre os que desejam ser advogados e os que desejam realizar concurso (a grande maioria).

Dentre os que desejam advogar, poucos descobre realmente possuir vocação para o negócio - os chamarei de feras. Os demais não têm qualidade para se destacar e lutam para se manter - os chamarei de rábulas.

Dentre os que querem realizar concursos, poucos possuem a dedicação (e a sorte?) necessária para conseguir uma rápida aprovação - os chamarei de nerds. Outros conseguem a aprovação, mas demoram um bocado para isso. Alguns advogam por necessidade e tentam conciliar estudo e trabalho - os chamarei de atolados. Por fim, a maioria acaba desistindo e, contra a vontade, contentam-se com a advocacia - são os frustrados.

Quero observar que a divisão acima é minha particular visão das coisas e, como é óbvio, não pode lida com absolutismo. Cada grupo admite subdivisões e exceções. Tem bacharel que não passa em concurso, mas se torna grande advogado. Tem advogado que nunca quis fazer concurso mas que, por um motivo ou por outro, repentinamente acaba resolvendo fazer concurso... Enfim, tem de tudo.

Mas acho que a classificação acima chega bem perto das principais situações.

Pois bem. Quem são os advogados que vão defender os necessitados em um sistema como o de Santa Catarina?

Bom, os feras dificilmente fazem serviço pro bono. Podem até pegar um ou outro caso para gradar o amigo juiz, mas o verdadeiro trabalho será feito pelos seus estagiários ou advogados recém formados contratados pelo seu escritório.

Os nerds advogam só o necessário para "inteirar" o prazo necessário para a prática jurídica exigida nos concursos públicos. Normalmente em escritórios da família ou de amigos.

Assim, o necessitado acabará sendo defendido pelos rábulas, atolados ou frustrados. E aí seu direto vai pelo ralo.

Sejamos honestos, por pouco mais de um salário mínimo, que advogado qualificado vai aceitar trabalhar em um processo que pode durar anos e render diversas audiências? Que advogado que aceite uma remuneração como esta vai recorrer e mesmo chegar a provocar os tribunais superiores?

Talvez por isso, como disse Sérgio Sérvulo ao se manifestar hoje pela AJD, não tenha ele conseguido encontrar um único Habeas Corpus nos tribunais superiores e que sejam originados da "defensoria dativa" do Estado de Santa Catarina.

Para muitos, é claro, estas considerações são desimportantes. Afinal, para o pobre, "qualquer coisa serve".

Sobre o tema, refiro-me ainda ao post Defensoria Pública X Defensoria Dativa.

Por fim, o STF, à unanimidade, deu total procedência a ambas as ADIs e declarou inconstitucional o modelo catarinense. Houve uma interessante discussão sobre a modulação de efeitos. O relator sugeriu manter a eficácia das normas inconstitucionais por seis meses para dar tempo ao Estado para criar sua Defensoria. Prevaleceu o prazo de 12 meses.

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segunda-feira, 5 de março de 2012

Defensoria Pública consegue a conversão de preventiva em tratamento para viciado em drogas acusado de roubo

O Defensor Público sediado em Nova Cruz, Thiago Souto de Arruda, comunicou ao blog decisão do magistrado daquela Comarca que acatou pedido da Defensoria Pública e aplicou medida cautelar de tratamento a viciado em drogas acusado de crime de roubo, deixando de aplicar a prisão preventiva.

Eis a decisão:

Autos n.º 0000143-10.2012.8.20.0107
Classe Liberdade Provisória Com Ou Sem Fiança/PROC
Requerente XXX

Vistos etc.
Trata-se de novo pedido de Liberdade Provisória c/c aplicação de medida cautelar consubstanciada em internamento.

No caso em tela, não bastasse o documento acostado aos autos (fls. 10 e 11), dando conta de problemas de saúde relacionados ao consumo de entorpecentes por parte do acusado, este magistrado recebeu em seu gabinete a genitora do acusado, a qual relatou com detalhes toda a angústia que tem sofrido em razão dos problemas de seu filho, merecendo, sem dúvida alguma, inteira confiabilidade. Consiste tal postura num relatório preciso, minucioso e penoso de toda sua angustiante vivência.

Com efeito, em todo o contexto que vem a ser apresentado a este Juízo, quer me parecer neste momento adequado e suficiente a aplicação de medida cautelar diversa da prisão, ademais quando o requerente não apresenta, a meu ver, qualquer periculosidade.

ASSIM SENDO, pelas razões expendidas, com arrimo nos arts. 310 e 319 do CPP, presentes os requisitos da custodia cautelar, FIXO as medidas cautelares insertas no artigo 319, VII, do CPP, consistente em:

1. Internamento em instituição de saúde (casa de saúde Natal) para tratamento de dependência química de entorpecente.

Fica ciente o preso que, em caso de fuga do estabelecimento de saúde, ocasionando o descumprimento da medida, poderá ser decretada a sua prisão preventiva.

Comuniquem-se, com urgência, as vítimas para que tomem conhecimento da soltura do indiciado, bem assim da medida aplicada, devendo esta providência ser tomada de imediato.

Expeça-se alvará de soltura.

Ciência ao Ministério Público acerca da presente decisão.

Nova Cruz, 29 de fevereiro de 2012.

Marcio Silva Maia
Juiz de Direito

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Novo diretor de Alcaçuz barra entrada de Conselho Penitenciário e Defensor Público

Na data de hoje, o novo Diretor de Alcaçuz, o maior presídio do Estado do Rio Grande do Norte, impediu o acesso do Conselho Penitenciário aos pavilhões de Alcaçuz. 

Segundo o Conselheiro Manuel Sabino Pontes, que é Defensor Público Estadual, o Diretor do Presídio disse que só permitiria a fiscalização do órgão em data e hora escolhida por ele e previamente agendada.

A decisão inusitada e inédita descarta normas cogentes da Lei de Execução Penal e da Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública, podendo configurar inclusive o crime de abuso de autoridade.

Leia aqui o relatório da visita à Alcaçuz e as providências a serem adotadas pelo Conselho.

O Conselho Penitenciário emitiu a seguinte nota à imprensa:

1. A Lei de Execução Penal estabelece expressamente que incumbe ao Conselho Penitenciário inspecionar os estabelecimentos e serviços penais (art. 70, II, da Lei 7.210/1984).
 
2. Na manhã do dia 5 de março de 2012, cinco membros do Conselho Penitenciário do Estado do Rio Grande do Norte foram à Penitenciária Estadual de Alcaçuz realizar a fiscalização que a lei determina que seja feita.
 
3. No entanto, o Diretor da Penitenciária Estadual de Alcaçuz, Cléber Torres Galindo, não permitiu que o Conselho Penitenciário tivesse acesso à nenhuma dependência do estabelecimento prisional. De acordo com Cléber Torres Galindo, o Conselho Penitenciário somente poderia realizar fiscalizações em dia e hora previamente marcados pela direção da Penitenciária Estadual de Alcaçuz.
 
4. É absolutamente desarrazoado que o fiscalizado (a Penitenciária Estadual de Alcaçuz) determine ao fiscalizador (o Conselho Penitenciário) quando a fiscalização acontecerá. Sabe-se que, na prática, as inspeções em presídios, quando agendadas, retiram do Conselho Penitenciário a real percepção da situação do estabelecimento prisional, impedindo um acompanhamento efetivo.

5. É de notório conhecimento público a precária, degradante e desoladora situação em que se encontram todos os estabelecimentos prisionais vinculados ao Estado do Rio Grande do Norte, inclusive, e principalmente, a Penitenciária Estadual de Alcaçuz. A conduta de embaraçar as atividades do Conselho Penitenciário, impedindo-lhe indevidamente de realizar suas funções, além de em nada contribuir, só piora este quadro deprimente e comprova que o Estado do Rio Grande do Norte se encontra muito longe de ter uma correta e profissional administração de seu sistema prisional.

6. O Conselho Penitenciário do Estado do Rio Grande do Norte informa à sociedade que adotou as medidas necessárias à coibição desse abuso contra o exercício de suas funções, inclusive com a comunicação do fato ao Ministério da Justiça e ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, órgãos que repassam recursos para o sistema prisional do Estado do Rio Grande do Norte, por acreditar que quem não se submete às fiscalizações legais não apresenta a transparência necessária ao recebimento de recursos provenientes de outros entes políticos, até porque, de acordo com o § 4º do art. 203 da Lei de Execução Penal, o descumprimento injustificado dos deveres estabelecidos para as Unidades
Federativas implicará na suspensão de qualquer ajuda financeira a elas destinada pela União, para atender às despesas de execução das penas e medidas de segurança.


7. Por fim, o Conselho Penitenciário do Estado do Rio Grande do Norte esclarece, ainda, que seguirá desempenhando plenamente suas funções, apesar dos empecilhos apresentados à sua atuação.

Natal-RN, 5 de março de 2012.

PAULO SÉRGIO DUARTE DA ROCHA JÚNIOR
Presidente do Conselho Penitenciário do Estado do Rio Grande do Norte

VALDIRA CÂMARA TORRES PINHEIRO COSTA
Conselheira

MANUEL SABINO PONTES
Conselheiro

FRANCISCO ELOILSON SALDANHA DE PAIVA
Conselheiro

NELISSE DE FREITAS JOSINO DE VASCONCELOS
Conselheira

GUIOMAR VERAS DE OLIVEIRA
Conselheira

MARIA DALVA ARAÚJO
Conselheira

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sexta-feira, 2 de março de 2012

A gravidade da mera opinião de um promotor (Conjur, 01/03/2012))

Assisti ao júri de Josef K., personagem de Franz Kafka. Sentada, ali no plenário, o desenrolar e desfecho desse processo do Senhor J. não poderia ser mais igual. Um senhor, 53 ou 56 anos, não se sabe se o registro de nascimento foi feito exatamente na data certa ou tempos depois, como é comum nos confins do norte/nordeste do país, com a aparência de alguém de 70 anos. Surdo, esticava algumas vezes a orelha direita, “seu melhor ouvido”, para tentar encontrar uma pista do que se passava. Homem mais do que simples, brasileiro que mal fala português, e quando escuta finalmente o que lhe está sendo dito, não compreende nem ao menos a metade. Logo desistiu de alcançar o teor das cenas e diálogos que se desenrolavam frente à sua vista.

O Senhor J. se desentendeu com uma vizinha, que arrancou sua plantação mínima de milho cultivada entre - limites dos dois terrenos, e arrancou da terra sua colheita próxima. Tratou-se de uma discussão sobre 30 centímetros de terra. Fútil? Era a qualificadora que a ele foi imposta. Um homem para quem a terra plantada tudo significa. A vizinha, diabolicamente articulada, pediu ajuda ao marido da amiga, pessoa culta de bairro próximo, para resolver a situação com o “velho safado”. Assim inicia-se uma tragédia. O homem chamado pede o auxílio do bicheiro e traficante seu amigo, aquele com uma ficha criminal extensa e “respeitável”, e dirigem-se à casa do senhor J. , cheios de “justiça” nas mãos.

Armados de pedaços de pau levam o “usurpador” para os fundos e aplicam-lhe uma lição. Assim que escapa, sangrando, o Senhor J., que lembrem-se, não deve ter escutado ou entendido sobre o que se tratava a surra que levava, entrou em seu pequeno cômodo. Quando viu seu portãozinho ser derrubado, e de tão pequeno que era o cômodo o portão lhe bateu no peito, alcançou uma faca, e cego pelo sangue que lhe escorria pelas faces, alvejou o primeiro que pode e saiu correndo pela porta. Acertou a jugular do indivíduo, sem ao menos saber o que é uma veia jugular ou onde fica, matando-o. Assustado, correu quanto pode, arrumou dinheiro e fugiu para o Piauí, com medo da revanche e da polícia. Fugiu para a roça, de onde nunca deveria ter saído. Aí está nosso “criminoso” do dia.

Anos depois, capturado em sua rotina pacata, algemado, voltou à grande cidade, dessa vez para morar nos porões das penitenciárias paulistanas. Até, ao menos, seu julgamento. Quase dois anos se passaram, até que fosse marcado finalmente o dia de seu juízo final, assistido por jovem advogado pro Bono, há menos de um mês no caso. E as cortinas se abrem para que a “justiça” seja feita.

Assisti um conhecido promotor, com carreira inigualável em número de inocentes condenados, espremer sua próxima vítima. O método utilizado por esse profissional é execrável, pois se utiliza o que seriam “dados periciais” para rechear uma história que compromete o réu. Funciona de maneira simples: se está escrito no laudo necroscópico que uma facada veio de cima para baixo, da direita para a esquerda, na região clavicular, ele bradará que a vítima foi atingida pelas costas “indubitavelmente”, de forma indefensável. Ampara-se em livros de anatomia bem desenhados, e reconstrói o crime utilizando pseudociência há muito banida das cortes americanas pelo Teste de Frye.

Esse teste refere-se a um padrão para admitir a evidência científica no julgamento, aceita ou rejeitada pelo juiz, pois um jurado pode, pela incompreensão do processo científico em que se baseia o pressuposto utilizado, condenar injustamente um réu. E assim foi feito contra o Senhor J., mais um na lista daqueles josés em que o processo não tem fotografias, laudo de local, reconstrução de crime feita por profissionais cientistas, nada. Não um Caso Nardoni ou Lindemberg, amparado por centenas de milhares de fotografias, exames, análises, pareceres. Dessa vez, nada.

O promotor completa a perversidade utilizando-se do velho e gasto, mas ainda competente discurso do medo. Aponta para o surdo ali sentado, como se fora a ameaça do aumento da impunidade e criminalidade, e brada teatralmente que, ao condenar, o jurado pode dormir tranquilo. Sem nenhuma vergonha de prometer o que sabe jamais ter possibilidade de ser cumprido, completa dizendo que o Senhor J. terá sua progressão de pena em dois meses apenas, caso seja condenado a doze anos de prisão. Sim, já cumpriu mesmo quase dois anos, 700 longos dias até aqui, o que seria 1/6 de sua sentença, e então é só ir ali, na Vara de Execuções Penais, pedir a liberdade e sair da prisão. Então, senhores jurados, pelo sim pelo não, vamos condenar o Senhor J., dormir tranquilos, porque, mesmo se não estiver exatamente correto, não faremos mal nenhum a ele.

Vi um jovem advogado de defesa tentar, em vão, explicar aos jurados, a legítima defesa e o homicídio privilegiado por violenta emoção após injusta provocação. Vi um jovem advogado tentar convencer os jurados, a maioria em seu primeiro júri, que se fizessem isso poderiam acompanhar o caso e ter a prova de que, em menos de um ano, culpa de nosso sistema abarrotado, o Senhor J. jamais veria a luz do sol novamente. Vi um jovem advogado, ainda acreditando no ser humano, explicar a situação kafkaniana do Senhor J., para quem talvez nem saiba que uma vez existiu um escritor chamado Kafka...Vi um jovem advogado explicar insistentemente que aquela conclusão baseada em uma frase do laudo necroscópico não era científica, e sim a mera opinião de um promotor apenas preocupado em condenar, não em fazer Justiça. Sim, um promotor chamado para condenar quando outro promotor vai pedir absolvição de réus obviamente inocentes, como em caso acontecido recentemente em Tribunal de São Paulo. Troca-se o promotor, troca-se o veredicto.

Vi um jovem advogado tentar, bravamente, trazer um pouco de humanidade em almas juradas sem esperança, talhadas por promotores com quem se relacionam cotidianamente, até com alguma intimidade, e em quem acreditam facilmente. Vi um jovem advogado se emocionar ao olhar seu próprio réu, ali sentado, alheio, sem escutar nenhuma testemunha. Garantido que ele escutou a pronúncia, como manda a lei. Mas compreendeu as palavras que lhe foram lidas? Nem em sonho!

E assim acaba o julgamento do pobre Senhor J., condenado por homicídio duplamente qualificado, a doze anos de prisão. Pobre em todos os sentidos que o dicionário pode trazer. Mas não se preocupem, em dois meses estarei no Tribunal, verificando se seu pedido de progressão de pena foi atendido. E enviarei correspondência pessoal a cada jurado, para que acompanhem o engodo no qual caíram. E publicarei a data em que o Senhor J. finalmente estará livre, para voltar às roças do Piauí.

Ilana Casoy
 é criminóloga, escritora e intergante do Núcleo de Antropologia do Direito na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH-USP).
 
Fonte: Conjur.

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quinta-feira, 1 de março de 2012